“Ela sofreu nas mãos daquele monstro desde os 13 anos. Foram oito longos anos de um sofrimento sem medida. Ela viveu um tormento”. O relato carregado de dor e pesar é de uma tia materna de Poliana da Silva de Oliveira, de 24 anos, assassinada a tiros pelo próprio pai, Antônio Marcos Pereira de Oliveira, de 45 anos, no município de Galvão, no Oeste de Santa Catarina.
O crime brutal ocorreu na manhã da última segunda-feira (1º), no Centro do município, localizado a 108 quilômetros de Chapecó, a maior cidade da região. O esposo de Poliana, Ewerton Bet de Oliveira, de 30 anos, também morreu. Ele chegou a ser socorrido e levado ao hospital, mas não resistiu aos ferimentos.
Segundo a tia, que preferiu não se identificar, a irmã [mãe de Poliana] sofreu as mesmas agressões e abusos que a filha e precisou fugir para se livrar de Antônio. O homem apareceu apenas quando a menina tinha 12 anos.
“Conquistou a confiança e ela quis morar com ele, mesmo a família falando que ele era mal. Com o tempo percebemos — e achamos estranho — que ele afastou ela de todos os familiares do lado da mãe. Por ele ser violento, ninguém quis se impor”, recorda.
O pedido de socorro
Foi em 2019 que Poliana pediu ajuda. Foi por meio de mensagens no Facebook, que a jovem revelou à tia as torturas que vivia. “Contou que ele a espancava muito, de todas as formas possíveis, mas que ela tinha medo e nunca contou para ninguém, pois ele ameaça matar os familiares e até mesmo a própria filha de Poliana. Foi para livrar a filha que ela teve coragem para fugir de lá com a minha ajuda direta”, revela.
A tia da jovem enviou ao ND+ mais de 40 prints das conversas com a sobrinha, nas quais Poliana relata as diversas torturas que sofria do pai. Em respeito à família, não divulgaremos todos. Os relatos são carregados de dor e demonstram o sofrimento vivido. “Eu tenho medo, muito medo”, disse Poliana em uma das conversas.
Poliana então fugiu para a cidade de Jaraguá do Sul/SC. O tio buscou ela e a filha e as levou, pois apenas longe teria coragem para denunciar. “Ela me contou alguns horrores que passou. Não sei como conseguiu suportar tudo”.
Ewerton, com quem Poliana se casou após autorização do pai, foi morar com ela e a filha. Após as denúncias e a prisão preventiva de Antônio, o casal voltou para perto da família. Poliana havia engravidado do segundo filho e quando chegou a cidade soube que ele havia sido solto, pois tinha o direito de aguardar o julgamento em liberdade.
Segundo a tia, Ewerton não tinha como ajudar uma vez que também vivia sob ameaça. “Conheceu o lado ruim dele [Antônio], foi agredido por ele e tinha muito medo. Ele fazia tudo pela Poli e a filha. Não deixava faltar nada para as duas e sofria por não conseguir tirá-las de lá”.
Traumas
A tia revela que Poliana era uma menina visivelmente traumatizada e transtornada, que vivia atormentada com medo que o pai cumprisse as promessas e ameaças que fazia.
“Ela fazia acompanhamento psicológico e psiquiátrico. Vivia sempre com a casa trancada, cortinas, portas e janelas sempre fechadas. Só abria se fosse mesmo necessário e quando alguém os visitava. Nunca dormia bem, ela dizia que sempre sonhava com o assassino chegando para matar ela e todos na casa”, conta.
Conforme a tia, uma característica muito marcante da jovem, é que mesmo sofrendo os piores horrores, ela era uma menina extremamente amorosa com todos. “Bondosa, tinha um coração puro e pensava só em ajudar as pessoas. Muitas vezes presenciei atitudes dela que eu admirava, pois passou tantas coisas ruins que se fosse uma pessoa ruim entenderíamos. Ela também amava a natureza e os animais. Tinha vários gatinhos e uma cachorrinha para quem dedicava muito amor”, afirma.
Crime brutal
Conforme relato da tia, no dia do crime brutal, Antônio teria entrado pela janela da casa onde a família estava. Ewerton teria sido a primeira vítima. “O que eu sei sobre o dia trágico é que ele o segurou no pescoço e atirou no peito, então o Ewerton caiu… A próxima vítima foi o irmão do Ewerton. Ele levou dois tiros e desmaiou”. O rapaz foi socorrido e passa bem.
Segundo ela, naquele momento, Poliana se entregou e foi ao encontro do pai implorando para que ele parasse, que não fizesse mais mal a ninguém, pois era ela que ele queria.
“Ele fez a Poli se ajoelhar em sua frente e atirou no rosto do lado esquerdo. Tiro esse que a matou imediatamente. Foi quando o sogro dela conseguiu pegar uma arma e atirar no agressor”, detalha.
Troca de tiros
Segundo informações do perito da Polícia Científica, Renan Locatelli, a perícia identificou que Poliana e Ewerton foram mortos com um tiro cada. A jovem foi morta por um tiro na cabeça, já o esposo foi atingido no peito. Ambos os tiros foram dados por um revólver.38, o mesmo que o pai de Poliana portava
“Ainda será feita a comparação balística para confirmar se foi deste revólver mesmo que saíram os tiros”, informa Locatelli. Ainda segundo o perito, o pai de Poliana foi morto com cinco tiros que saíram de uma pistola calibre.380. Os disparos foram todos no tórax e abdômen.
Relembre o caso
O pai, o Antônio, e a filha Poliana morreram no local da confusão, onde houve uma troca de tiros. O esposo dela, o Ewerton, também foi atingido, chegou a ser socorrido, mas morreu no hospital. O pai e o irmão dele também ficaram feridos, foram levados ao hospital de São Lourenço do Oeste/SC e passam bem.
O agressor já tinha passagens policiais por estupro, ameaça, rixa, desacato e entre outras. Chegou a ser preso, mas foi liberado para aguardar o julgamento solto.
A Polícia Civil ainda investiga o crime. As armas usadas, sendo dois revólveres e uma pistola, foram apreendidas e estão sendo periciadas.
A reportagem do ND+ tentou contato com o delegado da Polícia Civil, responsável pelas investigações, mas não obteve retorno até esta publicação. O espaço segue aberto e o caso sendo acompanhado.
Como denunciar?
A violência doméstica é um crime e deve ser denunciado. Entre os canais de denúncia estão a central de denúncias no 180, que atende todo o território nacional e também pode ser acessado em outros países. Além disso, a vítima pode denunciar por meio do 190 da PM (Polícia Militar) ou no 181 da Polícia Civil.
Outra opção de denúncia é no Botão do Pânico, uma ferramenta que está disponúvel no aplicativo PMSC Cidadão, aplicativo oficial da Polícia Militar de Santa Catarina.
Ele é destinado às mulheres que foram vítimas de violência doméstica, que possuem medida protetiva ativa e estão cadastradas no programa Rede Catarina de Proteção à Mulher, da PMSC.
Para estas mulheres, o Botão do Pânico está presente na tela inicial do aplicativo e basta um clique para que a Polícia Militar seja acionada e uma guarnição encaminhada para o socorro.
Por Caroline Figueiredo e Willian Ricardo/ND
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