A operação clandestina da Polícia Militar contra pessoas em situação de rua que ocorreu na madrugada da última terça-feira (31), em Itajaí, teria no comando um policial cuja ficha inclui uma condenação em segunda instância por tortura, com pena de sete anos de prisão. A PM não respondeu por que, apesar disso, ele permanece nas ruas e coordena equipes policiais.
Quando foram encontrados no acostamento da BR-101, em Balneário Camboriú, os mais de 30 moradores de rua expulsos de Itajaí e obrigados a caminhar em fila escoltados pela PM, sob ameaças e golpes de cassetete, relataram à secretária de Assistência Social de Balneário, Christina Barrichello, que os policiais diziam a eles que estava em curso a “Operação Tadeu”.
O sargento Tadeu José de Andrade era o “comandante de policiamento” naquela noite, o encarregado direto pelo trabalho policial. Em fotos publicadas em seu perfil nas redes sociais, ele aparece na companhia dos demais plantonistas da madrugada, de arma em punho, e com a legenda “Bom descanso Itajaí”, às 2h40min. A localização é no Morro do Matadouro, local onde estava a maioria das pessoas em situação de rua abordadas na “operação”.
Na manhã seguinte, diante da repercussão do caso, o comando da Polícia Militar informou em nota que desconhecia a “operação”. Disse que a ação foi feita por iniciativa dos próprios policiais, não era institucional, e reconheceu a irregularidade ao admitir que esse tipo de abordagem é feito apenas com a presença de equipes especializadas de assistência social. Confirmou, portanto, tratar-se de uma ação clandestina.
“Não se tratava de uma operação policial institucional e integrante de planejamento prévio, tendo sido feita à revelia e sem conhecimento de do Comando do Batalhão“, informou a nota.
O governador Jorginho Mello (PL) pediu apuração rigorosa do caso à Polícia Militar.
Sete anos de prisão
Tadeu José de Andrade é conhecido da Justiça em Santa Catarina. Ele foi acusado em 2011, com outros dois policiais, de torturar dois homens e uma mulher em Itajaí com chutes, pontapés e tiros de pistola taser, a arma de choque. A denúncia do Ministério Público afirma que uma criança também recebeu choques elétricos.
O sargento foi condenado por crime de tortura, em 2020. Recorreu ao Tribunal de Justiça e, em 2021, foi condenado pela segunda vez. Os desembargadores ajustaram a pena, que ficou fixada em sete anos, nove meses e seis dias de prisão em regime semiaberto. Também determinaram a perda do cargo.
Pela legislação brasileira, o sargento poderia ter sido preso, e obrigado a passar as noites na prisão. No entanto, o Ministério Público não requereu o cumprimento imediato da sentença, e isso não foi determinado pela Justiça. Atualmente, o processo está em fase de recurso no Supremo Tribunal Federal (STF), e ele recorre em liberdade.
A advogada de Tadeu no processo, Mariana Lixa, diz que levou o caso ao STF pela perda de função. A defesa entende que essa não pode ser uma consequência automática da condenação do policial militar, e que seria necessário outro processo para decidir sobre seu futuro na PM. É o que será discutido em Brasília. A última movimentação é de abril deste ano.
A coluna procurou o comando Regional da Polícia Militar nesta quinta-feira (2) e questionou por que, apesar de condenado à prisão por tortura, o sargento Tadeu José de Andrade não foi afastado das ruas e é escalado para comandar equipes. O comando respondeu que a PM se manifestaria por meio da assessoria de comunicação social. A PMSC informou que só irá se manifestar sobre o assunto após a conclusão do Inquérito Policial Militar que investiga o caso.
Tadeu não foi localizado pela coluna. A advogada Mariana Lixa disse que não o representa formalmente nesse caso até o momento, por isso não pode falar em seu nome. Ela é representante legal de outros sete policiais militares envolvidos na operação, e afirmou que eles irão prestar todos os esclarecimentos cabíveis quando forem solicitados.
Na quarta-feira (1), o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) encaminhou um ofício ao secretário de Estado de Segurança Pública, Paulo Cezar de Oliveira, recomendando o afastamento dos policiais envolvidos na operação. O documento diz que o afastamento é necessário para “evitar prejuízos para as investigações e considerando também a demonstração da absoluta incapacidade e da manifesta inaptidão desses agentes para atuarem nas ruas”.
Por Dagmara Spautz/NSC
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